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Futuro do isolamento desafia os gestores

Diante da falta de um posicionamento do Governo Federal, administradores têm que decidir por conta própria o futuro do isolamento social em estados e municípios

Sem uma frente federal para coordenar as ações no combate à pandemia do coronavírus (Covid-19), governadores têm escolhido caminhos diversos para enfrentar a doença, sobretudo no que se refere às formas de isolamento social. A despeito da insistência do presidente da República, Jair Bolsonaro (sem partido), pela reabertura da economia – como foi manifestado na ida ao Supremo Tribunal Federal (STF), acompanhado por empresários, na última quinta – a tendência majoritária no País é dissonante da defendida por ele.

A postura mais próxima da ideia bolsonarista tem sido registrada em Santa Catarina, estado governado pelo aliado Comandante Moisés (PSL), primeiro estado a reabrir o comércio, ainda em meados de abril. Outros aliados do Planalto também investem no afrouxamento das regras. Em Minas Gerais, comandada pelo governador Romeu Zema (Novo), municípios do interior também já estão retomando as atividades e a capital, Belo Horizonte, pode começar a retomada ainda em maio. Brasília é mais um exemplo que vislumbra o afrouxamento do isolamento social e só não começará a reabrir o comércio nesta segunda por intervenção do Ministério Público, que pediu informações ao governador Ibaneis Rocha (MDB) sobre o plano. Ainda assim, o retorno às atividades está previsto para 18 de maio.

Estado com o maior número de casos, São Paulo, por sua vez, ampliou a quarentena até o 31 deste mês, e na capital paulista um rodízio mais rígido de veículos foi implementado. Em Pernambuco, o governo vem defendendo que novas restrições poderão ser aplicadas para diminuir a transmissão do vírus entre a população.

Outros estados adotaram restrições mais rígidas como o lockdown. No Pará, a medida partiu do governador Helder Barbalho (MDB), que a aplicou na capital, Belém, e em outros nove municípios nos quais a expansão da doença supera o nível nacional. Lá, a partir deste domingo, haverá aplicação de multas para pessoas e empresas que descumprirem as medidas restritivas. O lockdown de Fortaleza, no Ceará, também partiu do Executivo. O governador Camilo Santana (PT) estabeleceu a medida, iniciada na última sexta com bloqueios nas entradas da cidade.

As decisões sobre o fechamento, no entanto, nem sempre são dos gestores. O primeiro bloqueio total do País, vigente na Grande São Luís, no Maranhão, por exemplo, foi determinado pela Justiça e não pelo governador do Estado, Flávio Dino (PCdoB), apesar deste defender medidas restritivas.

A judicialização tem sido outro fator importante nesses processo. Além de atuar pelo adiamento da reabertura em Brasília, o Judiciário tomou a frente em assuntos relacionados ao bloqueio no Rio de Janeiro, quando o Ministério Público pediu ao governador Wilson Witzel (PSC) um estudo sobre medidas de combate à pandemia. A ação inicial de Witzel foi dar aos prefeitos a responsabilidade de decretarem o bloqueio total, no entanto, diante do agravamento da situação no Estado, com o colapso se aproximando da rede pública, o governador já tem um ofício pronto para determinar o fechamento, inclusive com bloqueio de estradas estaduais e municipais.

No entendimento do professor da Faculdade de Direito do Recife João Paulo Allain Teixeira, apesar de muitas decisões estarem partindo do Judiciário, a responsabilidade de decidir é “sempre do gestor sanitário, portanto, prefeito, governador ou presidente”.

“O gestor é quem sabe as condições efetivas que poderão ser tomadas. Estamos acostumados no Brasil com o protagonismo do Judiciário determinando a agenda dos demais poderes. Esse processo tem criado a imagem de certa inércia nos demais poderes. Eu acho um grande equívoco”, avalia.

Antonio Lucena, cientista político e professor da Universidade Católica de Pernambuco (Unicap), ressalta que o cenário atual de aproximação de colapso é “grande responsabilidade do governo federal”. “Ao mesmo tempo, a Presidência da República manda mensagens equivocadas. A ‘blitz’ de Bolsonaro no Supremo foi um dos episódios mais lamentáveis, pressionar para liberalização, terminaram levando até um puxão de orelha do (presidente do STF, Dias) Toffoli. Se foi planejado ou não é irrelevante, mas mostra que há pressão pela reabertura diante de uma curva ascendente de falecimentos e leitos saturados. Os outros países só flexibilizam a reabertura quando os governos tem certeza que a curva (de casos) é descendente”, frisa.

Vácuo de liderança
A falta de um plano federal de Bolsonaro e do ministro da Saúde, Nelson Teich, é uma queixa dos gestores. Em carta direcionada ao presidente, em meados de abril, a Frente Nacional dos Prefeitos (FNP) cobrou um protocolo federal para orientação dos municípios para a retomada das atividades. Até aqui, entretanto, o vácuo de liderança da União persiste. O secretário executivo da FNP, Gilberto Perre, define o momento atual como uma “distopia federativa”. Para ele, a falta de coordenação e a emissão de “sinais terríveis” do governo Bolsonaro em relação ao isolamento social atrapalham o enfrentamento da pandemia. “O governo federal e a Presidência da República precisam cumprir um papel constitucional. A função da Presidência é a harmonia federativa e essa função está sendo negligenciada, não se instalou, até agora, uma comissão federativa para enfrentamento da crise. Certamente, parte dessas mortes se devem a essa função (liderança) não exercida pelo Governo federal.”

“Há ausência de um protocolo de orientação com critério técnicos, parâmetros, para os governadores e prefeitos tomarem as decisões com maior segurança jurídica. Vivemos um escândalo do ponto de vista federativo”, avalia Perre. Perre alerta que o debate que coloca Saúde e Economia como rivais na crise é, em grande medida, provocado por Jair Bolsonaro. “O que estamos fazendo está atrapalhando a economia e atrapalhará a retomada da economia. A ausência de um plano para entrar e sair do isolamento nos traz problemas econômicos seríssimos. O empresariado não sabe se adere ou não, ‘o presidente disse isso, o prefeito disse aquilo’. Não sabe se reabre, se demite os funcionários, se dá férias. A insegurança é a pior situação que a economia pode ter.”

Cenário
Rafael Ramos, economista da Fecomércio, reconhece que o “foco atual” é na saúde, mas ressalta que a economia vive um momento extremamente complicado e carece de ação dos gestores para minimizar o impacto. Ele explica um cenário complexo e frisa que é muito difícil para um estado, município ou país “suportar o fechamento de mais de 50% do setor produtivo por mais de dois meses”. “Tira renda da população, afeta a economia e as famílias como um todo e, por fim, acaba atingindo o setor público com queda de arrecadação. E o setor público precisa da arrecadação para assumir responsabilidades com essas famílias”.

Para ele, futuras medidas podem impactar na economia caso ocorra a restrição de deslocamento entre municípios. “A capital é referência, então muitas pessoas de outros municípios tendem a fazer feiras no Recife. Os grandes varejistas que estão na capital poderiam ter uma complicação maior”, avalia, acrescentando que o comércio de Pernambuco acumula perdas de R$ 2,8 bilhões por conta da pandemia. Ele ressalta que a eventual reabertura do comércio deve ser avaliada pelos setores público e privado, para que se chegue à “melhor situação sem consequências graves para o aumento da infecção”.

A postura dos gestores na reabertura e a possibilidade de aumento de casos da Covid-19 foram pontos que fizeram a FNP pedir uma direção ao Governo Federal. Essa também é uma preocupação dos especialistas da Saúde. Para o do infectologista do Hospital Oswaldo Cruz, Filipe Prohaska, a revisão do isolamento, quando feita, “deveria ser diferente de cidade para cidade”. “Há cidades com disseminação maior que outras, estados também. Então os casos devem ser avaliados de forma específica”.

Ele sinaliza que a reabertura do comércio e serviços obrigatoriamente vai gerar aumento da circulação de pessoas, principal vetor de contágio da doença. “O grande problema da reabertura é este. Vai ter aumento gradual da circulação, então aumenta muito o risco de propagação do vírus. Há uma clara necessidade de se ter cuidados, ter orientação, para prevenir isso”, afirma o infectologista, acrescentando que, quando ocorrer, o retorno não será efetuado com as normas vigentes antes da crise na Saúde.

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5 pensamentos “Futuro do isolamento desafia os gestores”

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